Araguaína, 22 de maio de 2025 – A década de 1960 foi um período decisivo para a história de Araguaína e da região norte do Tocantins, marcada pela chegada da Companhia Industrial da Bacia Amazônica (CIMBA), uma iniciativa visionária dos irmãos Benedito Vicente Ferreira e Ademar Ferreira. O impacto da CIMBA ultrapassou as fronteiras da indústria mineral, impulsionando um desenvolvimento econômico, social e cultural que permanece vivo na memória da população e no legado da região.
O contexto histórico: uma região em transformação
(foto: Sen. Benedito Boa Sorte com o a época Presidente do Brasil, Ernesto Geisel - 1978) Naquela época, Araguaína ainda era uma pequena cidade localizada na então zona rural do norte de Goiás, que só viria a se tornar o estado do Tocantins em 1988. A economia local era limitada à agricultura de subsistência e ao comércio modesto, com poucas indústrias e infraestrutura bastante incipiente. Foi neste cenário que os irmãos Ferreira decidiram apostar em um projeto ousado: a instalação da CIMBA.
A Cimba, foi a primeira indústria da cidade e do norte goiano, com atividades voltadas para a extração de madeira, refinamento e envasamento de óleo de babaçu, beneficiamento de algodão, empacotamento de arroz e produção de sabão.

Segundo relatos históricos, os Ferreira, mais conhecidos pela alcunha de ‘Os Boa Sorte’ — nome originado por terem vindo de Goiânia após a fundação e sucesso do atacadista de secos e molhados situado na Avenida Anhanguera, chamado ‘Armazém Boa Sorte’ — eram irmãos órfãos de pai e mãe ainda na infância. Vindos de origens humildes, possuíam uma visão empresarial aguçada e sabiam da importância de investir em uma indústria capaz de gerar empregos, atrair investimentos e promover a modernização da região.
"Eles acreditavam que a industrialização seria o caminho para transformar Araguaína e seus arredores em um polo de desenvolvimento sustentável e dinâmico," conta Paulo Vicente Ferreira, neto de Benedito, em entrevista exclusiva.
A fundação da CIMBA e o início de uma revolução econômica
(foto: Cimba 1963)
Fundada oficialmente no início dos anos 1960, a CIMBA rapidamente se tornou uma das maiores indústrias da região. Seu principal foco era o processamento mineral, aproveitando a riqueza natural da Bacia Amazônica e agregando valor à economia local. A implantação da CIMBA não significou apenas a chegada de uma nova empresa, mas uma verdadeira revolução que atraiu milhares de trabalhadores e suas famílias, mudando o perfil demográfico e social da cidade.
O êxodo populacional provocado pela CIMBA foi um dos fenômenos mais marcantes da história regional. Pessoas de vários estados brasileiros — como Goiás, Minas Gerais, São Paulo, Pará e Maranhão — migraram para Araguaína em busca de trabalho e melhores condições de vida. “O crescimento populacional foi exponencial. De uma cidade pequena e pacata, Araguaína tornou-se em poucos anos um centro urbano pujante e repleto de oportunidades,” lembra o historiador local Carlos Mendonça.
O papel multifacetado dos irmãos Ferreira: indústria, agroindústria e mídia
Os irmãos Benedito e Ademar Ferreira não pararam por aí. Além da CIMBA, foram os idealizadores e fundadores do frigorífico Frimar, que dinamizou o setor agroindustrial local, trazendo tecnologia e novos mercados para a região. Paralelamente, investiram fortemente em comunicação com a criação da Rádio e Televisão Boa Sorte — veículos pioneiros que até hoje fazem parte da história midiática do Tocantins.
Entre esses empreendimentos, destaca-se a Rádio Som Araguaia, instalada dentro das dependências da CIMBA. Foi a primeira emissora AM da cidade e uma das mais potentes da região. Seu sinal conseguia alcançar localidades distantes como Anápolis, em Goiás, a mais de 1.000 quilômetros de Araguaína — um feito tecnológico impressionante para a época. A rádio desempenhou papel fundamental na divulgação de notícias, na promoção cultural e na integração social da região.
“Rádio Som Araguaia era muito mais que uma estação de rádio — era uma ponte que unia comunidades distantes, levando informação, música e esperança para um povo que buscava se afirmar,” destaca Paulo Vicente Ferreira. “Ela ajudou a criar um senso de pertencimento e identidade regional.”
O impacto social e urbano do crescimento industrial
A chegada da CIMBA gerou uma transformação profunda na estrutura urbana de Araguaína. Para acomodar os trabalhadores e suas famílias, foram construídas moradias, escolas e serviços públicos, o que estimulou o desenvolvimento da cidade em vários níveis. A infraestrutura urbana começou a se modernizar, com melhorias nas estradas, no fornecimento de energia elétrica e saneamento básico.
Além disso, a presença da indústria fomentou a diversificação econômica, incentivando o comércio, a prestação de serviços e o surgimento de pequenos negócios locais. “Foi um ciclo virtuoso. A CIMBA criava empregos diretos, o que aumentava a renda e estimulava o consumo, gerando mais oportunidades para toda a comunidade,” explica o economista regional Marcos Leal.
Parque CIMBA: a preservação da memória industrial
(foto: Antiga Área da Indústria - Atual Parque Cimba)
Hoje, onde funcionava a CIMBA, está localizado o Parque CIMBA, um espaço público criado para preservar as ruínas da antiga indústria como patrimônio histórico e cultural de Araguaína. As estruturas remanescentes — galpões, maquinários enferrujados, pilares e fundações — são testemunhas silenciosas de um passado de progresso e empreendedorismo.
“O Parque CIMBA é um monumento vivo da história da cidade e um espaço para as futuras gerações aprenderem sobre as raízes do desenvolvimento local,” afirma a secretária municipal de cultura, Ana Cláudia Martins. “A preservação dessas ruínas é fundamental para manter viva a memória coletiva.”
A trajetória de Benedito “Boa Sorte” Ferreira e o legado político
O livro “De Engraxate a Senador” (Editora Kelps, Goiânia-GO, 2008), escrito por Paulo Vicente Ferreira, narra a inspiradora trajetória do seu avô Benedito Vicente Ferreira, conhecido popularmente como Benedito “Boa Sorte”. De origem humilde, Benedito construiu uma carreira política notável, chegando ao Senado Federal e influenciando decisivamente as políticas públicas do Tocantins e da Amazônia.
“Meu avô sempre teve o sonho de melhorar a vida das pessoas de sua terra e da região amazônica. A CIMBA foi parte desse projeto de transformação, assim como o frigorífico, a rádio e a televisão,” conta Paulo. “Ele era um homem que via a política como uma ferramenta para o desenvolvimento e inclusão social.”
O impacto cultural e midiático da Rádio e Televisão Boa Sorte
A criação da Rádio e Televisão Boa Sorte foi um marco para o Tocantins, levando informação e entretenimento a milhares de pessoas. Esses veículos foram responsáveis pela promoção da cultura regional, pela divulgação de notícias locais e pela formação de uma consciência política e social na população.
A televisão, ainda em seus primórdios na região, ajudou a aproximar as comunidades rurais e urbanas, enquanto a rádio continuava a ser o principal meio de comunicação popular.
“Eles souberam usar a comunicação para fortalecer a identidade local e abrir espaço para vozes que antes não eram ouvidas,” analisa o jornalista local José Almeida.
Um legado que inspira o futuro
Paulo Vicente Ferreira acredita que a história da CIMBA e da família Ferreira é um exemplo vivo do poder da visão, do trabalho duro e do compromisso social para transformar realidades. “Conhecer nossa história é essencial para que possamos aprender com o passado e construir um futuro mais justo e próspero para Araguaína e toda a região amazônica,” conclui.
(foto: Paulo Ferreira)
O legado da Companhia Industrial da Bacia Amazônica não está apenas nas ruínas ou nos documentos históricos, mas na vida de milhares de pessoas que tiveram suas vidas transformadas e nas perspectivas de desenvolvimento sustentável que continuam a inspirar líderes e empreendedores até hoje.